Mas apesar do embaraço.
Meu amigo mão-de-onça,
me responda companheiro,
você se lembra da festa
que se deu neste terreira:
eu falo dum casamento
que abalou o mundo inteiro!
Aquilo, sim, que era festa!
Como não tem hoje em dia,
dançava cachorro e gato,
bicho comia e bebia,
só não foi muito melhor
por causa da latomia.
Como houvera de esquecer,
se trago aqui na lembrança,
meu amigo Zé da Zilda,
eita festa de lembrança
quem de tal vai se esquecer,
velho, menino ou criança!?
Era a lei dum tal de “mufe”,
que medonha confusão:
a noiva por fim chegava;
mas o padre era que não,
cansado de tanta espera,
pois a espera era em vão,
O noivo mandou tocar
sanfona, gaita, zabumba,
mode o couro comer solto,
parecia até macumba,
baião, forró e xaxado,
samba, bolero e ate rumba!
O povo estava animado,
uma “gaitagem” só,
Zequinha pegou Firmina,
Ficaram que nem um nó
dançando pelo salão,
chega levantam pó!
Porém alguns toques,
Zé macambira, a pedido,
Tocou um toque mais lento
e o noivo já comovido
arroxou mais a Firmina,
por debaixo do vestido.
Parece que ela fez gosto,
chego soutou um suspiro,
e ele assim arrepiado,
na dança fez longo giro,
por detrás de uma forquilha,
caçando por um retiro!
Por ali imprialzinho
um gavião peneirando,
sem ir pra la, ou pra cá,
no mesmo canto rodando,
sem saber que o pai dela,
os dois estava espiando.
Foi Rufina, a sogra dele,
sogra só presta na morte!
Que gritou a Epaminondas:
o cabra perdeu o norte,
ta apalpando a Firmina;
deu um cangapé na sorte!
O que o peste está fazendo?
Parece amancebamento!
Isto assim não pode ser,
porque não tem cabimento;
para pegar nas partes dela,
só depois do casamento!
Foi aí que o pai saltou,
por sima da ligeireza,
bufando que nem um touro,
disto não tenho certeza,
gritando vou te matar,
por causa da safadeza!
Ca.. Ca... Cabra safado,
disse o velho com a gagueira,
dando de garra das armas,
que estavam pela algibeira,
e o noivo sentiu no buxo,
pontadas de caganeira!
Os jagunços do pai dela,
todos cabras bons de briga,
partiram para a refrega,
estava feita a intriga,
tudo por culpa do padre,
que faltou à desobriga.
Foi aí que o pai do noivo,
o velho Sebastião,
O Seu Bastião dos bichos,
coronel mais valentão,
fez fogo no bacamarte
por sima da multidão.
Sua mulher Cabriola
até parece que via,
sendo cega de nascença,
nunca vira a luz do dia,
mas naquele reboliço
o facão era seu guia!
E naquele ruge-ruge
ninguém não tinha rasão,
noiva, noivo, sogra e sogro,
todos brigavam em vão,
por causa de coisa de coisa besta:
do noivo passar a mão!
Epaminondas, coitado,
levou um soco na cara,
Zequinha saiu correndo
e a noiva gritando pára!
Rufina caiu deitada,
Bastião tacou-lhe a vara!
Bastião e Epaminondas,Rufina mais u'a Raimunda,
Zequinha e um tal Linha-Fina,
era aquela barra funda!
Foice, machado, facão...
mão na cara e pé na bunda!
Então Maria Firmina,
a pobre noiva inocente,
vendo seu pai apertado
no meio daquela gente,
gritou: larguem o meu pai,
se não eu viro a serpente!
Dando de garra na foice,
metida pelo frechal,
também pegou dum machado
e dum pedaço de pau,
ainda caçou a enxada;
mas não tava no quintal!
Mas nisto o padre chegava,
o vigário Severino
vindo doutra freguesia
que o desta perdera o tino,
pra fazer o casamento,
mandou bater logo o sino!
Que diabo se passa aqui?
Gritou o padre enfezado,
vamos parar com a rixa,
cada qual para o seu lado,
os noivos aqui em frente,
vamos que estou vexado!
Todo mundo de joelho!
Senão nem faço o casório,
e nem dava pra tirar,
falou de lá um simplório
e o padre lhe respondeu,
pois bote um supositório!
Foi Zequinha do caju
ajoelhar-se primeiro,
depois Maria Firmina
ao lado do companheiro,
que perdia por ali
a condição de solteiro!
A noiva não era bela;
mas tinha lá seu encanto,
os peitos deste tamanho,
a bunda lá outro tanto,
chega o padre até babava,
posto de pé no seu canto.
Ó seu vigário, se avexe,
já me cansa esta capela,
e dizia Firmina aflita;
mas o padre, sem cautela,
não tinha pressa de nada
e os olhos nos peitos dela!
Seu vigário eu lhe afirmo,
ta me dando uma frenesim,
case ou desocupe a moita,
que não vai ficar assim,
que sou donzela, decente,
tire seus olhos de mim!
O padre sem disfarçar
deu ainda uma olhadela;
mas indagando do noivo:
você quer casar com ela?
O cabra disse que sim,
vou cair na esparela!
Promete fidelidade
na saúde ou na doença
até que a morte os separe?
Confirme ou peça dispensa,
o cabra quis se negar,
mas assinou a sentença!
Pela indecisão do noivo,
o padre deu-lhe um esbregue:
seu menino, tenha tento,
pegue de jeito ou não pegue,
se não quer diga que não
e a mão dela me entregue!
Terminada a cerimonia,
recomeçou a folia:
o sanfoneiro tocava
foi parar no outro dia
comida que nem prestava,
bebida que nem se via
ainda teve uma briga,
coisa mais sem fundamento,
foi quando algum safado,
fez um brinde ao casamento:
viva o noivo, viva a noiva,
com os ovos do noivo “dento”
o noivo então virou bicho,
e “bebo” saiu a esmo,
perguntando a todo mundo,
mas quente que um torresmo,
quem foi que disse tal coisa?
E o povo dizia: eu mesmo!
E foram muito felizes,
aquilo era um bom casal,
isto sem contar os chifres,
por ser coisa mais banal,
ela puxou a mãe dela,
uma da outra é igual!
R. B. Sotero